segunda-feira, 14 de março de 2016

Vertigens de um Relacionamento


Trata-se de coragem para mergulhar na causa de nossas feridas. O processo de cura interna exige um movimento de energias que lida com a ancestralidade e também nossos descendentes.
Quando um relacionamento está um caos, a maioria de nós lida superficialmente: ou evitamos discutir o assunto fazendo vista grossa para a realidade que nos atinge, ou resolvemos literalmente não mais discutir para não criar discórdia.
Então lhe convido a ler esta matéria a qual retirei em sua grande parte do livro Mulheres que Amam de Mais de Robin Norwood – Quando você continua a desejar e esperar que ele mude.
Questões familiares são repassados de mãe para filha, de neto para bisneto e quando não nos damos conta, continuamos a vivenciar inconscientemente padrões negativos perpetuando a negação, a rejeição e necessidade de controle.
A crença ocidental baseia os relacionamentos em romances de conto de fadas através de uma interpretação deturpada onde existem mulheres redimindo homens por meio de um amor altruísta, perfeito e que tudo aceita.
“Em A Bela e a Fera, uma jovem bela e inocente encontra um monstro repulsivo e assustador. Para salvar sua família da ira do monstro, ela concorda em viver com ele. Após conhece-lo melhor, acaba superando sua aversão natural e passa a amá-lo apesar de sua persona animal. Então, é claro, acontece um milagre, e ele é libertado de sua aparência monstruosa e devolvido ao seu verdadeiro eu, não só humano como também principesco
As verdades espirituais são muito difíceis de compreender, e ainda mais de ser postas em prática, pois frequentemente vão contra valores contemporâneos. Por isso, há uma propensão a interpretar o conto de fadas de um modo que reforça a tendência cultural. Assim, é fácil perder todo o seu significado mais profundo.
A tendência cultural que esse conto de fadas parece enfatizar é a de que uma mulher pode mudar um homem se o amar o suficiente.
Essa crença, tão forte e difundida, está no cerne de nossas psiques individuais e grupais. A suposição tácita de que podemos mudar alguém para melhor por meio da força do nosso amor e de que, se somos mulheres, é nosso dever fazer isso, reflete-se repetidamente em nosso discurso e comportamento diário. Quando alguém com que nos importamos não age ou se sente como desejamos, procuramos modos de tentar mudar o comportamento ou humor dessa pessoa, geralmente com a bênção daqueles que nos aconselham e encorajam nossos esforços. (...) Até mesmo a mídia participa disso, não só refletindo esse sistema de crença como também, com sua influência, reforçando-o e perpetuando, e ao mesmo tempo continuando a delegar tarefas para as mulheres.
Por que a ideia de transformar alguém infeliz, doentio ou algo pior em nosso parceiro ideal nos agrada tanto? Por que esse é um conceito tão sedutor, tão duradouro?
Para alguns, a resposta parece óbvia: o conceito de ajudar os menos afortunados está incorporado à ética judaico-cristã. Ensinam-nos que é nosso dever reagir com compaixão e generosidade quando alguém tem um problema. Não julgar, mas ajudar; essa parece nossa obrigação moral.
Infelizmente esses motivos virtuosos de forma alguma explicam totalmente o comportamento de milhões de mulheres que escolhem como parceiros homens cruéis, indiferentes, abusivos, emocionalmente indisponíveis, viciados ou de outro modo incapazes de ser amorosos e interessados. As mulheres que amam de mais fazem essa escolha devido a uma grande necessidade de controlar aqueles que lhe são mais próximos. Essa necessidade se origina em uma infância na qual muitas emoções opressivas frequentemente são experimentadas: medo, raiva, tensão insuportável, culpa, vergonha, pena dos outros e de si mesma. Uma criança que cresce em um ambiente desses pode ser devastada por essas emoções a ponto de só conseguir funcionar desenvolvendo modos de se auto proteger. Suas ferramentas de autoproteção sempre incluem um mecanismo de defesa poderoso, a negação, e uma motivação subconsciente igualmente poderosa, o controle.
A negação pode ser definida como uma recusa a reconhecer a realidade em dois níveis: no nível do que realmente está acontecendo e no nível do sentimento. (...) Além disso, se um membro da família tentar por fim a essa negação, por exemplo, descrevendo a situação familiar em termos exatos, em geral o resto da família resistirá fortemente a essa percepção. Com frequência farão uso de ridicularização para realinhar essa pessoa ou, se isso falhar, o membro da família renegado será excluído do círculo de aceitação, afeição e atividade.
Ninguém que usa o mecanismo de defesa da negação escolhe conscientemente se dessintonizar com a realidade para deixar de registrar corretamente o que os outros estão dizendo e fazendo.
E ninguém em que a negação está operando decide não sentir suas próprias emoções. Tudo isso “simplesmente acontece” quando o ego, em sua luta para oferecer proteção contra conflitos, fardos e medos opressivos, elimina informações que são problemáticas demais.
Uma mulher que habitualmente pratica a negação e o controle será arrastada para situações que exijam essas características.
A negação, mantendo-a fora de contato com a realidade de sua situação e sentimentos com respeito a essa realidade, a levará para relacionamentos repletos de dificuldades. Então ela empregará toda a sua capacidade de ajudar/controlar para tornar a situação mais tolerável, ao mesmo tempo negando o quanto realmente é ruim  a negação alimenta a necessidade de controlar, e o fracasso inevitável em controlar alimenta a necessidade de negar.
Voltando ao conto de fadas A Bela e a Fera, parecia ser um meio de perpetuar a crença em que uma mulher tem o poder de transformar um homem se o amar com devoção. Nesse nível de interpretação, a história parece defender a negação e o controle como métodos para alcanãr a felicidade. Bela, amando o temível monstro inquestionavelmente (negação), parece ter o poder de muda-lo (controla-lo), tal interpretação parece certa, porque se encaixa nos papéis sexuais que nossa cultura impõe. Contudo essa interpretação simplista ignora em grande parte o significado dessa história consagrada pelo tempo. Ela não perdura porque reforça os preceitos culturais e os estereótipos de uma era. Perdura porque incorpora uma lei metafísica profunda, uma lição vital de como viver bem e com sabedoria.
Então, qual é o ponto principal de A Bela e a Fera? É a aceitação.
A aceitação é a antítese da negação e do controle. É uma disposição de perceber qual é a realidade e deixa-la existir, sem necessidade de muda-la. Nisso reside uma felicidade que não provém de manipular condições externas ou pessoas, mas desenvolver paz interior mesmo diante de desafios e dificuldades.
Lembre-se de que no conto de fadas a Bela não tinha nenhuma necessidade de mudar a Fera. Ela o estimava realisticamente, o aceitava como era e apreciava suas boas qualidades. Não tentou transformar o monstro em um príncipe.
Devido a atitude de aceitação da Bela, a Fera ficou livre para se transformar em seu próprio melhor eu. O fato de seu verdadeiro eu ser um belo príncipe (e um parceiro perfeito para ela) demonstra simbolicamente que ela foi muito bem recompensada por sua aceitação.
A verdadeira aceitação de um indivíduo como ele é, sem tentar muda-lo por meio de incentivo, manipulação ou coerção, é uma forma elevada de amor muito difícil de ser praticada pela maioria de nós. No fundo de todos nossos esforços para mudar outra pessoa já um motivo basicamente egoísta, uma crença em que se a mudarmos seremos felizes. Não há nada de errado em querer ser feliz, mas colocar a fonte dessa felicidade fora de nós, nas mãos de outra pessoa, significa evitar nossa capacidade e responsabilidade de mudar nossa própria vida para melhor.
Se por exemplo, o parceiro de uma mulher é um workaholic e ela reclama com ele das longas horas que passa fora de casa e lhe implora para não fazer mais isso, qual costuma ser o resultado? Ele passa o mesmo tempo ou mais longe dela, sentindo que tem o direito de fazer isso para fugir de suas intermináveis lamentações. Em outras palavras, ao reclamar, implorar e tentar muda-lo, na verdade a mulher permite acreditar que o problema entre eles não é a compulsão por trabalho, mas os resmungos dela. De fato, a compulsão da mulher por mudá0lo pode contribuir tanto para a distância emocional entre eles quanto a compulsão por trabalho por ele.
A compulsão por trabalho é um distúrbio sério, como são todos os comportamentos compulsivos. Serve a um objetivo na vida do marido, provavelmente evitar que ele experimente a intimidade que teme e o afloramento de várias sensações desagradáveis, principalmente ansiedade e desespero. (...) A tarefa de sua esposa não é endireitar a vida do marido, mas melhorar a dela.
Frequentemente não reivindicamos nossa felicidade porque acreditamos que o comportamento de outra pessoa nos impede de fazer isso. Ignoramos nossa obrigação de nos desenvolvemos enquanto tramamos, manobramos e manipulamos para mudar outra pessoa, e ficamos zangadas, desanimadas e deprimidas quando nossos esforços falham.
Para a esposa de um workaholic ficar livre para ter uma vida própria satisfatória, independentemente do que seu marido faça, ela deve passar a acreditar que o problema é dele e não dela, e que não está ao seu alcance e nem é seu dever ou direito de muda-lo. Deve aprender a respeitar o direito dele ser quem é, embora preferisse que ele fosse diferente.
Quando ela faz isso, fica livre – livre de ressentimento pela indisponibilidade dele, livre de culpa por não ser capaz de muda-lo e livre do peso de tentar sempre mudar o que não pode. Com menos ressentimento e culpa ela pode começar a sentir uma maior afeição por ele e as qualidades nele que realmente aprecia.
Quando ela desistir de tentar muda-lo e redirecionar sua energia para desenvolver seus próprios interesses, experimentará felicidade e satisfação, não importa o que ele faça. Pode acabar descobrindo que seus objetivos são suficientemente satisfatórios para ela ter uma vida própria rica e gratificante, sem grande companheirismo por parte de seu marido. Ou, à medida que ela for se tornando cada vez menos dependente dele para sua felicidade, pode chegar à conclusão e decidir seguir com sua própria vida livre do constrangimento de um casamento insatisfatório.
Nenhum desses caminhos é possível enquanto a mulher precisar que o homem mude para ela ser feliz.
Até que o aceite como é, ficará paralisada em um desenho animado interrompido, esperando que ele mude para poder começar sua vida.
Quando uma mulher que ama demais desiste de sua cruzada para mudar o homem em sua vida, ele reflete sobre as consequências de seu próprio comportamento. Como ela não está mais frustrada e infeliz, mas cada vez mais animada com a vida, o contraste com a própria existência dele se intensifica. Ele pode escolher tentar se livrar de sua obsessão e se tornar mais disponível física e emocionalmente. Ou não. Mas independentemente do que ele decida fazer, ao aceitar o homem em sua vida exatamente como ele é, de um modo ou outro a mulher se torna livre para viver sua própria vida – feliz para sempre.”

por Nádia Bouças
Bibliografia: Norwood; Robin (2008) - Whomen Who Love Too Much





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